Pontes // Muralhas

Se há a escolha de fazer diferente então o porquê da insistência na repetição é um dos maiores mistérios sobre os quais paira uma cortina. Se em vez de pontes, muralhas são construídas e se em vez de plantar, apenas se queima, então a condenação ao mesmo é um juízo que aceitamos, digamos os que disser.




É pessoal escrever de novo. E porque haveria de não ser, verdade seja dita. Porém desta vez é particularmente mais pessoal. Poderá ser o facto de o querer fazer de novo à muito tempo, poderá ser o facto de se aproximar o meu Inverno. No entanto sinto que há algo mais. Há um ligeiro pormenor, uma ligeira repetição que revela uma grande contradição que já não é fruto da imaginação. Como que uma escolha subtil, condenada à ideia que já está gravada nas ações já programadas. Falo da escolha da ligação, da escolha da vulnerabilidade. 

O velho tema da vulnerabilidade, o velho tema que a cada Inverno se repete, de uma forma ou de outra, para revelar à luz diurna uma contradição entre o dito e o feito, entre o que se quer e o que se finge querer, entre o "correto" e o verdadeiro. Um problema já com muitos anos de existência, remendado com fita-cola a cada dúvida existencial e escondido sobre camadas de teorias e ideias, de trabalhos e de projetos, de ideais e de sonhos, misturados tão profundamente com a identidade que o que dali nasce não traz a luz ao interior, obscurece a paisagem em neblina. 

No fundo, é apenas uma crise de identidade. De se saber o que se quer, como se quer, mas de faltar a peça mais fundamental. Aliás, de se fugir a essa mesma peça. De procurar preencher isso com algo que talvez fizesse sentido na altura, mas agora deixara de o fazer. De procurar razões e porquês, de analisar tudo ao pormenor com demasiada matemática implícita para fazer sentido. Porque há coisas que talvez só a irracionalidade emocional seja capaz de explicar e a ela deveríamos dar o espaço para se fazer sentir e para se fazer justificar.

Se tento construir pontes com os outros, antes de as fazer já as destruo. Se elas já estão construídas, destruo. Com ligeiras exceções, dou apenas certas camadas de mim sem nunca dar a mesma camada a mais que uma pessoa. E no meio dessas camadas todas, onde fica a minha identidade? Longe. Enfim, onde afinal ando eu e a minha ligação com os outros?

Muitas vezes digo que não estamos sozinhos, mas muitas vezes também digo que no fim de contas só nos temos a nós mesmos. Mas se só foco na última, então de que serve o resto? É um ciclo. É um maldito ciclo. Mas pelo menos é revelado de novo pela luz do dia. Já o consigo ver. Será que é algo que se transforma então, assim que é revelado? Ou esperará pela degeneração de tudo onde toca até se transformar na fénix prometida? 

Se calhar vejo demasiado, mas igualmente vejo muito pouco. Agora vejo a ponte a ruir e as muralhas sólidas. Se calhar é altura de destruir um para construir o outro. Ou se calhar, não passa tudo de uma tempestade num copo de água e eu, apenas, um mero expectador nas decisões que tomei. 

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